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  • Foto do escritorJulino Soares

Não se deve usar “chá de quina” para o tratamento ou prevenção da COVID-19

Ana Cecília Bezerra Carvalho Julino A. R. Soares Neto


De acordo com matéria publicada pelo National Geographic , está circulando nas redes sociais que o chá feito com as cascas da quina “imuniza o corpo e combate a COVID-19”. As cascas estão sendo indicadas pela presença de quinina, um alcaloide antimalárico que contribuiu para o desenvolvimento da cloroquina e hidroxicloroquina, utilizadas no tratamento de várias doenças e recentemente divulgadas como "tratamento precoce da COVID-19", apesar de não possuir autorização de uso para esta indicação. Além de questionar o uso não comprovado destas substâncias para o tratamento da COVID-19, a matéria consultou especialistas que alertaram que nenhuma das espécies produtoras de quinina (gênero Cinchona) crescem naturalmente no Brasil, e que as plantas divulgadas poderiam ser as chamadas falsas-quinas, que podem provocar efeitos desconhecidos e tóxicos.


"nenhuma das espécies produtoras de quinina (gênero Cinchona) crescem naturalmente no Brasil, e que as plantas divulgadas poderiam ser as chamadas falsas-quinas, que podem provocar efeitos desconhecidos e tóxicos"

Deste modo, tem-se vários problemas na divulgação do chá da quina para a COVID-19. Inicialmente, mesmo que a planta divulgada fosse a correta, contendo quinina, essa substância não é isenta de toxicidade, podendo causar problemas cardiovasculares, por exemplo. Fazendo-se o chá dessa planta, diversas outras substâncias são extraídas, das quais não se conhece completamente os efeitos farmacológicos e toxicológicos. Esses riscos são aumentados quando não se sabe nem mesmo qual planta está sendo utilizada. Adicionalmente, não se sabe se o material vegetal comercializado se encontra em condições de higiene adequadas para o consumo, podendo conter bactérias, fungos e outras substâncias prejudiciais. Por fim, é importante ressaltar que não existem estudos científicos suficientes que demonstrem que a quinina, ou qualquer outra substância similar, como a cloroquina ou hidroxicloroquina, sejam eficazes na prevenção ou tratamento da COVID-19.


Tropicos - Name: Cinchona officinalis L. Photographer: David Stang
Tropicos - Name: Cinchona officinalis L. Photographer: David Stang

A pandemia causada pelo SARS-CoV-2 reabriu uma discussão sobre busca de alternativas nas plantas medicinais, porém, esse uso tem que ser feito embasado em pesquisas científicas que demonstrem que as plantas selecionadas são seguras e efetivas nas formas disponibilizadas. Enquanto isso não ocorre, a divulgação de produtos irregulares deve ser evitada e ações de esclarecimento à população devem ser realizadas. A manutenção e a recuperação da saúde também dependem de boas informações que quando são falsas ou duvidosas, contribuem para um tratamento inadequado, por não possuir efeitos terapêuticos e ainda retardam a busca por auxílio médico, o que pode ser fatal em pacientes com a COVID-19.


O fortalecimento das pesquisas científicas em fitoterapia e Práticas Integrativas e Complementares (PICs) possibilitou que diversos saberes tradicionais pudessem contribuir para a medicina moderna e para a saúde pública, mas os usuários e pacientes precisam compreender que a capacidade terapêutica da fitoterapia e das PICs também possuem limitações e que a ciência, e mesmo os saberes tradicionais de cura, exigem dedicação e tempo para que se possa compreender os seus métodos e contextos.


 

1 National Geographic. Chá de quina vendido no Brasil não combate o coronavírus e pode trazer riscos à saúde.


Tropicos - Name: Cinchona officinalis L. Photographer C. Ulloa Ulloa
Tropicos - Name: Cinchona officinalis L. Photographer C. Ulloa Ulloa

 

§ Dr. Julino Soares: Pós-doutorando pela Faculdade de Saúde Pública da USP e Pesquisador Associado no Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário da USP. Pesquisador Colaborador no Programa de Políticas Públicas da UFABC.

§ Dra. Ana Cecília Carvalho: Possui mestrado em Produtos Naturais e Sintéticos Bioativos pela UFPB (2005) e doutorado em Ciências da Saúde pela Universidade de Brasília (2011). Atualmente é especialista em regulação e vigilância sanitária da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

 

Fonte: Ana Cecília; Julino Soares. Planfavi - SISTEMA DE FARMACOVIGILÂNCIA EM PLANTAS MEDICINAIS. CEBRID, UNIFESP. ISSN: 2596-1918 Nº 55 julho/setembro 2020. Disponível em: https://www.cebrid.com.br/boletins/planfavi/planfavi-edicoes-anteriores/

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